Imagem extraída da internet |
Apesar de
tudo, insisto. A despeito de mim mesmo, teimo. Insisto e teimo por querer a
eternidade. Alguém plantou transcendência em minha alma. Mesmo diante do
pavor de confundir esperança com alucinação, não consigo dissimular minha
obstinação pelo que está além de mim.
Preciso tornar-me peregrino que se descalça
diante do Sagrado. Deixar que o Mistério me deixe atônito. Desfazer-me de panos
velhos para não remendar-me com os andrajos de uma religiosidade rota. Trocar
odres antigos pelo vinho novo do Espírito.
Quero uma espiritualidade que enfrente a
verdade de existir com tudo o que a vida trouxer de bom ou de ruim.
Desejo viajar até as fronteiras do universo não como fuga, mas como sede da
grande Utopia – a mesma que move os Santos. Quero soprar o pavio fumegante da
minha voz profética para ser farol, mesmo em um vilarejo distante.
Anseio por uma espiritualidade que esgote a
soberba de minha onipotência e permita que a mesma bruma que empurra a caravela
empine a bandeira do meu combate. Preciso repensar a coragem para que a minha
força venha da fragilidade.
Almejo uma espiritualidade suave: delicada
como a mão da criança, indefesa como o olhar do cordeiro e despretensiosa como
o fluir do ribeiro. Necessito esvaziar-me do desejo de brilhar – que a oração
mais pura fique escondida no quarto onde durmo. Ainda hei de encarar o apelo do
poder como maldição. Qualquer glória só a Deus pertence – invejá-la é
diabólico.
Anelo por uma espiritualidade que não se
encaramuja. Que abre mão de palavras piedosas como disfarce e procura a magia
de viver na encarnação, fazendo do corpo o lenho que transforma água amarga em
doce.
Suspiro por uma espiritualidade sem
fronteiras. Quero rasgar mapas para chamar o Próximo de meu irmão. Exorcizar o
medo de perder a reputação. Abrir espaço para que o excluído se sinta acolhido.
Sonho entender como o grão de trigo morre sem murmurar – por saber que carrega
o futuro em suas entranhas.
Aspiro por uma espiritualidade que ame
igualmente o belo e o disforme, o funcional e o deficiente; o lépido e o
claudicante. E alimente a alma com as cores do cotidiano: azul, preto, rubro,
amarelo, cinza, branco.
Ambiciono navegar. Já que viver nunca é
preciso, abrir mão de atracar em qualquer Porto Seguro. Sem âncoras,
continuar a singrar o futuro como um oceano de possibilidades.
Soli Deo Gloria
Texto do pr. e escritor
Ricardo Gondim.
Parece-me que me todos nós foram semeadas essas sementes e nunca estaremos em paz connosco próprios
ResponderExcluir